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terça-feira, 25 de julho de 2023

Transtornos alimentares: o que são, quais os tipos e como a psicanálise pode ajudar?

Tenho certeza de que você já ouviu a expressão “transtorno alimentar” e da mesma forma tenho certeza de que você já leu sobre o assunto na internet (a rede está inundada de reportagens e artigos – confiáveis ou não – sobre o tema), e posso apostar que você se interessou por este artigo aqui exatamente porque você tem, ou acha que pode ter algum transtorno alimentar, ou conhece alguém que foi diagnosticado com essa doença.



“Ah, então o transtorno alimentar é uma doença?” Sim, os transtornos alimentares são doenças do campo da psiquiatria que precisam de tratamento tanto medicamentoso quanto terapêutico. A psicanálise pode auxiliar no tratamento, sim, como veremos adiante.

Como o significado da palavra indica, “Transtorno é sinônimo de alteração, contratempo, contrariedade e prejuízo.” Então, pensando em termos de alimentação podemos dizer que seria uma forma, um jeito inadequado, uma dificuldade (inconsciente! É importante que isso fique bem claro!) de se alimentar adequadamente que vai causar um desconforto, um prejuízo (para a saúde física e psíquica), ou seja, terá consequências não benéficas para a pessoa com essa questão.

Se consideramos ainda que o conceito de “Doença” que é um conjunto de sinais e sintomas específicos que afetam um ser vivo, alterando o seu estado normal de saúde”, podemos afirmar que, sim, qualquer tipo, entre os mais variados, de transtornos alimentares já catalogados pela medicina psiquiátrica, trata-se de uma doença, grave, e que necessita ser adequadamente diagnosticada e, tratada.

Podemos, então, afirmar que os transtornos alimentares são condições de saúde mental que afetam a relação de uma pessoa com a sua alimentação e o seu peso corporal e sua relação com seu entorno social. São caracterizados por padrões anormais de comportamento alimentar, pensamentos distorcidos sobre o corpo e preocupação excessiva com a forma física. Trazem prejuízos à vida funcional da pessoa e comprometem significativamente a saúde física,  mental e social.

Números

Infelizmente o Brasil não possui ainda uma quantidade significativa de pesquisas nesse campo. Porém, estima-se que não seja muito diferente do que acontece ao redor do planeta.

Para se ter uma ideia, mais de 70 milhões de pessoas no mundo estão diagnosticadas com algum tipo de transtorno alimentar. Quem diz é a Associação Brasileira de Psiquiatria e a informação pode ser encontrada facilmente no site do Ministério da Saúde.

No Brasil, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que no mínimo 5% da população possui algum tipo de transtorno alimentar o que representaria cerca de 10 milhões de pessoas, dados de 2022.

A pandemia de Covid-19 agravou significativamente esse quadro que já não era bom. Mas todos os estudos referem-se a estatística fora do Brasil. Por exemplo, uma equipe de pesquisadores liderada por Daniel J. Devoe, do Mathison Centre for Mental Health, da Universidade de Calgary, Canadá, realizou uma revisão sistemática examinando a literatura científica sobre covid-19 e Transtornos Alimentares.

Cinquenta e três estudos foram incluídos nessa revisão sistemática, totalizando 36.485 pessoas com Transtornos Alimentares. Destas: 3.223 apresentavam anorexia nervosa; 1.203 bulimia nervosa; 722  transtorno de compulsão alimentar periódica; 1.243 outros transtornos alimentares especificados; 126 transtorno alimentar restritivo/evitativo; 47 transtorno purgativo; 25 síndrome da alimentação noturna. A média de idade dessas pessoas era de 24 anos com prevalência de 90% para mulheres.

Apenas os adultos sofrem com esse tipo de transtorno? Infelizmente, não.



Crianças e adolescentes também engrossam as estatísticas mundiais como revela um outro estudo mais recente, de fevereiro de 2023, publicado pela revista eletrônica JAMA Network (The Journal of the American Medical Association é um periódico médico revisado por pares, publicado 48 vezes por ano pela American Medical Association. Publica pesquisas originais, revisões e editoriais cobrindo todos os aspectos da biomedicina) que incluiu 63.181 participantes de 16 países, em que 22% relataram que crianças e adolescentes apresentavam distúrbios alimentares. A proporção foi ainda mais elevada entre meninas, adolescentes mais velhos e aqueles com maior índice de massa corporal. E o mais preocupante é que o estudo, quando menciona crianças e adolescentes está se referindo a um público que vai dos 6 aos 18 anos! A pesquisa alerta para o aumento assustador desse tipo de transtorno nas crianças e adolescentes nos últimos 50 anos.

Segundo o estudo, “a causa dos transtornos alimentares é muito complexa e, à semelhança de outros transtornos psiquiátricos como a depressão e a ansiedade, decorre da combinação de diversos fatores de risco. A prevalência de transtornos alimentares em crianças e adolescentes (11 a 19 anos) tem sido estabelecida entre 1,2% (meninos) e 5,7% (meninas), com incidência crescente nas últimas décadas. Considerando que a adolescência é um período de pico de transtornos alimentares e seus sintomas, conhecer e compreender a proporção de transtornos alimentares entre os jovens é uma questão crucial.”

Um dos maiores problemas que envolvem o diagnóstico de transtornos alimentares, ainda segundo o estudo “é o fato de algumas crianças e adolescentes com transtornos alimentares conseguirem ocultar os principais sintomas da doença e retardar a busca por atendimento especializado devido a sentimentos de vergonha ou estigmatização.” Ou seja, é bastante provável que os transtornos alimentares sejam subdiagnosticados e, consequentemente, subtratados.



Pais, professores, responsáveis pelas crianças ou adolescentes, ​​e também os profissionais de saúde, devem estar atentos aos sintomas dos distúrbios alimentares, que incluem comportamentos tais como preocupação exagerada em fazer dieta para perda de peso, compulsão alimentar, vômitos autoinduzidos, exercícios excessivos e uso de laxantes ou diuréticos sem que tenha havido uma prescrição médica. Ou ainda uma percepção equivocada de seu próprio corpo, por exemplo, a pessoa está excessivamente magra, mas “se enxerga” gorda e vice-versa também! O indivíduo está visivelmente com excesso de peso, mas “se vê” magro. Vamos abordar esses casos mais adiante.

Possíveis causas e tipos dos Transtornos alimentar

Os transtornos alimentares, como já dissemos anteriormente, são doenças psiquiátricas, e ao lado de diversas outras doenças dessa ordem, estão catalogadas no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, da American Psychiatric Association, mais conhecido por DSM-5 (“5” porque ele já está na sua quinta versão).

Mas antes de partirmos para apresentar os tipos de transtornos alimentares, vamos explicar, afinal, por que motivo uma pessoa decide comer demais ou de menos (grosso modo é disso que se trata, mas existem também outros tipos de transtornos que envolvem o consumo de produtos que não são alimentos, como veremos logo mais).

Para a psicanálise, os distúrbios relacionados à alimentação geralmente surgem como uma espécie de defesa inconsciente da pessoa contra algo que nem ela é capaz de definir com clareza, que chamamos de angústia. E o que provoca a angústia? Geralmente a angústia é gerada por um conflito inconsciente dentre o desejo de realizar algo que a própria pessoa entende como “errado”, ou que a sociedade entende como errado, ou a Igreja, a religião, seus pais ou todos ao mesmo tempo, e que a pessoa acredita que se realizar esse desejo isso poderá “manchar” a imagem idealizada que ela tem de si mesma, ou que ela acredita que as pessoas em volta dela (amigos, pais, membros de alguma comunidade da qual ela faz parte) têm dela. Essa imagem idealizada que a maioria das pessoas tem, de ser boa, correta, sem defeitos provoca angústia quando confrontada por pensamentos e desejos de fazer algo que poderia abalar essa imagem.

Por exemplo: uma jovem por volta de seus 16 anos, que tem uma educação excessivamente rígida em relação à sexualidade (no sentido de proibições, repressões dos pais ou da igreja que frequenta) pode desenvolver fantasias através de pensamentos ou até mesmo sonhos em que o sexo é uma constante. Isso causa a ela uma angústia que ela pode tentar aplacar de diversas formas: consumo excessivo de álcool, outras drogas, consumo de roupas ou outros objetos sem necessidade e, da mesma forma, a ingestão descontrolada de comida. Ou, o oposto, a recusa em comer. Mas, repito, isso não acontece de forma racional. Ou seja, a pessoa não pensa: vou comer, comer, comer porque tenho “maus pensamentos” que preciso manter escondidos de tudo e de todos. Não. Quem sofre de transtornos alimentares (ou de quaisquer outros tipos de transtornos não alimentares) simplesmente sente uma angústia inexplicável, aparentemente sem uma razão específica, que precisa ser acalmada, digamos assim, de alguma forma. Uma delas pode ser através de um dos transtornos alimentares descritos a seguir.

Quais são os tipos de transtornos alimentares mais conhecidos?

Os mais conhecidos e catalogados no DSM-5 são também os mais prevalentes, ou seja, que possuem mais notificações médicas e, consequentemente são os que mais atingem a população como um todo: Compulsão Alimentar, Anorexia e Bulimia.

Compulsão alimentar - Em primeiro lugar é necessário diferenciar a compulsão alimentar daquele exagero eventual que podemos cometer durante uma festa de fim de ano, um casamento, um aniversário, por exemplo, ou diante de um prato de nossa preferência que a mamãe ou a vovó preparou para nós com todo o carinho. Exagerar nesses casos, não configura compulsão alimentar.

Para se caracterizar como compulsão alimentar alguns “ingredientes” devem estar presentes nessa “receita”. Um deles é a ingestão de alimentos muito acima do normal, acima do necessário, de forma incontrolável pelo indivíduo, que pode até se iniciar durante um evento social e se prolongar após a pessoa chegar em casa. Por exemplo, “um indivíduo pode começar a comer compulsivamente em um restaurante e depois continuar a comer quando volta para casa. Lanches contínuos em pequenas quantidades de alimento ao longo do dia não seriam considerados compulsão alimentar”, explica o DSM-5. Além da falta de controle e da quantidade excessiva, outro fator relevante é a falta de critério do que comer. O compulsivo alimentar vai misturar doces e salgados, por exemplo, pode misturar arroz e feijão com torta de maçã, sorvete com coxinha, não importa, não existe uma escolha racional. Vai consumir o que estiver disponível, o que encontrar em armários ou na geladeira.



Outra característica fundamental é a vergonha em comer compulsivamente. A pessoa o fará escondido, longe dos familiares ou de conhecidos, tentará esconder vestígios do que foi consumido. Se sentirá muito mal se for pega em flagrante. “Indivíduos com transtorno de compulsão alimentar geralmente sentem vergonha de seus problemas alimentares e tentam ocultar os sintomas”, diz o DSM-5, o que dificulta muitas vezes o diagnóstico. Um agravante da compulsão alimentar são os métodos compensatórios que a pessoa utiliza para tentar minimizar os efeitos nocivos como ganho de peso: uso de laxantes e provocar o próprio vômito, o que nos leva a um outro transtorno bastante conhecido.

Bulimia nervosa – Um dos fatores diagnósticos da bulimia é a presença da compulsão alimentar. Outros são os comportamentos compensatórios como já dissemos, uso de laxantes e provocar o próprio vômito. O bulímico faz isso mais de uma vez por semana, às vezes todos os dias, às vezes em todas as refeições, nos casos mais graves. Existe uma insatisfação, muitas vezes injustificada, com seu próprio corpo. Porém, muitas vezes a compulsão alimentar pode ocorrer em razão de a pessoa estar de fato acima do peso, mas não necessariamente obesa (aliás, é bom que se diga que a obesidade não está no rol dos transtornos alimentares, nem das doenças psiquiátricas, ou seja, obesidade não faz parte do rol de doenças catalogadas pelo DSM-5, embora a medicina a considere uma doença que, da mesma forma, precisa ser tratada).

O maior risco da bulimia para o indivíduo é o de suicídio. De acordo com o DSM-5 “a avaliação completa de indivíduos com esse transtorno deverá incluir determinação de ideação e comportamentos suicidas, bem como outros fatores de risco para suicídio, incluindo história de tentativas de suicídio.” A ideação suicida se apresenta para pessoas com esse tipo de transtorno justamente porque ela não vê a curto prazo uma solução ou uma melhora. Como ela se sente infeliz e culpada, com baixíssima autoestima a maior parte do tempo, muitas vezes vai pensar que acabar com sua própria vida é igualmente acabar com aquele problema.



Anorexia Nervosa – Aqui é a ingestão exageradamente restritiva de alimentos que caracteriza esse transtorno. Apesar disso, todos os fatores que compõem a compulsão alimentar, como a bulimia, estão presentes, por exemplo, a pessoa pode até se alimentar para cumprir um protocolo social, por exemplo, um almoço em família, ou um evento social com amigos, que funciona como um, digamos, “disfarce” do problema, e imediatamente à ingestão ela vai provocar o vômito sem que ninguém perceba.

O que leva muitas vezes familiares e amigos a desconfiar que algo não vai bem é a excessiva perda de peso da pessoa anoréxica. Mas ela vai negar que esteja magra e, de fato, ela não se vê magra como já dissemos. O perigo de a anorexia se manifestar em adolescentes, por exemplo, (em crianças, é muito raro), é o comprometimento do desenvolvimento corporal e psíquico. As pessoas com anorexia têm verdadeira obsessão em se pesar, em conferir suas medidas com frequência e não aceitam que estejam se prejudicando ou se tornando subnutridas. Esse comportamento com frequência compromete o tratamento porque a pessoa simplesmente não acredita que está doente. Pelo contrário! O anoréxico enxerga sua perda de peso como resultado de sua grande disciplina e autocontrole.

Pica – Caracteriza-se pela ingestão de produtos que não são nem alimentos nem nutritivos, por exemplo, fezes, terra, papel, sabão, tecido, cabelo, fios, giz, talco, tinta, cola, metal, pedras, carvão vegetal ou mineral, cinzas, detergente ou gelo, em grandes quantidades. Algumas crianças quando estão começando a engatinhar ou a andar e estão conhecendo o mundo, não raro comem um cocô de cachorro que encontram pelo caminho, ou uma porção de terra, ou um pedaço de sabonete quando já tomam seu banho sozinhos na banheirinha. Esses eventos não são transtornos alimentares. Esse transtorno, também conhecido como alotriofagia, é chamado Pica ou síndrome de Pica devido a uma espécie de pássaro conhecida como Pica Pica. Este pássaro, também chamado de pega-rabuda, se alimenta de quase tudo o que vê pela frente...

Essa síndrome pode vir acompanhada de outras doenças como transtorno do espectro autista e esquizofrenia, principalmente quando acomete adultos, e, segundo o DSM-5 “pode estar associada a tricotilomania (transtorno de arrancar o cabelo) e transtorno de escoriação (skin-picking) e pode igualmente estar associada ao transtorno alimentar restritivo/evitativo”, que veremos a seguir.



Transtorno alimentar restritivo/evitativo – Parecido com a anorexia, esse distúrbio alimentar leva à perda de peso excessiva, porém, as razões se diferenciam porque nesse caso um agravante é que se trata da criança na primeira infância (do 0 aos 6 anos) que se recusa a comer determinados alimentos seja por sua aparência, cor, textura, odor, temperatura ou paladar. Não se trata de uma recusa pontual que eventualmente e normalmente as crianças menores de 6 anos podem fazer. Trata-se de uma recusa persistente que leva não só à perda evidente de peso como à uma deficiência nutricional grave. Em crianças mais velhas e adolescentes, a evitação e a restrição alimentar podem estar associadas a dificuldades emocionais mais generalizadas como ansiedade depressão.

De acordo com o DSM-5 “crianças com transtorno alimentar restritivo/evitativo podem ser irritadiças e difíceis de consolar durante a amamentação ou parecer apáticas e retraídas”. Em alguns casos, a relação mãe e filho pode contribuir para o problema de alimentação do bebê (por exemplo quando a mãe apresenta o alimento de maneira inapropriada ou interpreta o comportamento do bebê como um ato de agressão ou rejeição). A falta de nutrientes adequados pode exacerbar as características associadas como irritabilidade, atrasos no desenvolvimento e contribuir ainda mais para as dificuldades de alimentação.

Transtorno de Ruminação – Ruminar é tornar a mastigar ou a mascar os alimentos já mastigados e engolidos que voltam do estômago à boca. É exatamente esse ato, que não tem origem em problemas gastrointestinais, que caracteriza esse tipo de transtorno alimentar. Porém, para ser diagnosticado é necessário que ele aconteça no mínimo durante um mês. Essa é a característica essencial do transtorno de ruminação. Segundo o DSM-5 “o alimento previamente deglutido que já pode estar parcialmente digerido é trazido de volta à boca sem náusea aparente, ânsia de vômito ou repugnância. O alimento pode ser remastigado e então ejetado da boca ou novamente deglutido.”

Outra característica que deve estar presente é a frequência: deve ocorrer pelo menos várias vezes por semana, em geral todos os dias. É mais prevalente em indivíduos com alguma deficiência intelectual e em bebês que estejam amamentando. Quando acontece em adolescentes ou adultos, geralmente sentem vergonha, tentam esconder, principalmente porque é algo incontrolável, como aliás, todo transtorno psíquico e no caso aqui, alimentar. De acordo com o DSM-5 “nos lactentes, bem como em indivíduos mais velhos com deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou outros transtornos do neurodesenvolvimento, o comportamento de regurgitação e ruminação parece ter uma função calmante e estimulante semelhante à de outros comportamentos motores repetitivos, como balançar a cabeça ritmicamente”.

Síndrome do comer noturno – Sabe aquela fugidinha da cama para a cozinha para assaltar a geladeira durante a noite? Se for algo eventual, talvez não haja grandes consequência, mas esses “assaltos” à geladeira, para o DSM-5 podem significar problema à vista. Segundo o Manual essa síndrome faz parte da categoria Outro Transtorno Alimentar juntamente com outros que não reúnem os critérios para um transtorno alimentar específico ou não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico.

Mas os tipos de transtornos alimentares não terminam por aqui. Existem mais alguns que, apesar de ainda não estarem catalogados pelo Manual Diagnóstico de Transtornos Mentais causam danos à saúde e os profissionais da saúde como um todo já procuram tratá-los da melhor forma possível. Vamos a eles.



Ortorexia Nervosa - Caracteriza-se pela fixação por uma alimentação exageradamente saudável tornando-se uma obsessão doentia porque a pessoa só consegue se alimentar com o alimento biologicamente puro, o que, obviamente, acarreta restrições alimentares significativas. O indivíduo que sofre com essa síndrome possui uma preocupação exagerada com a qualidade dos alimentos, a pureza da dieta (livre de herbicidas, pesticidas e outras substâncias artificiais) e o uso exclusivo de “alimentos politicamente corretos e saudáveis”.

Embora exista um caráter positivo cultivado por uma alimentação saudável, a área da saúde já entende que determinados comportamentos supostamente “saudáveis” podem levar ao prejuízo da saúde. A consequência da ortorexia é que essas pessoas se privam, muitas vezes, de nutrientes essenciais ao bem-estar e à qualidade de vida. Além disso, tendem a se isolar socialmente, pois adquirem uma série de restrições alimentares que impedem o simples convívio social rotineiro. Não se trata de comer saudável, e sim de uma situação extrema e obsessiva em que a alimentação passa a dominar seus pensamentos e seus comportamentos. Ou seja, a pessoa acaba se isolando socialmente por não encontrar à sua disposição os produtos que acredita serem “puros” o suficiente para serem consumidos por ela.

Por ser um transtorno descoberto recentemente não existem estudos significativos nem estatísticas confiáveis. Entretanto, já se sabe que as consequências no estado nutricional de ortoréxicos são as mesmas que ocorrem a partir de uma alimentação inadequada como desnutrição, anemias, hiper ou hipovitaminoses, carência de nutrientes essenciais, hipotensão e osteoporose. Em casos mais avançados da doença, a própria carência de vitaminas pode acarretar alterações de comportamento que acentuam ainda mais a obsessão por alimentos saudáveis. É aquela velha máxima: nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Tudo que é exagerado para mais ou para menos resulta, na maioria dos casos, em transtornos...



Vigorexia – Também conhecida como Complexo de Adônis ou Transtorno Dismórfico Muscular a principal característica desse distúrbio é a percepção distorcida da imagem corporal e depreciação do próprio corpo. Possui prevalência acentuada no sexo masculino, porém pode atingir qualquer pessoa independentemente de classe social ou etnia. Adônis era o deus grego da Beleza, o correspondente a Vênus para a beleza feminina, que possuía medidas e forma física consideradas perfeitas. E desejar ser bonito ou ter um corpo que você olha e gosta do que vê não é necessariamente uma doença. Entretanto, esse distúrbio leva a pessoa a uma busca obsessiva por uma perfeição inalcançável e por exercícios musculares que teoricamente deveriam levá-lo a atingir seus objetivos que nunca são atingidos. Como consequência, essa busca incontrolável pelo corpo com músculos superdefinidos traz consigo a diminuição do investimento na vida emocional, social e ocupacional por conta das longas horas investidas em musculação dentro de academias. O grande objetivo é aumentar cada vez mais a sua massa muscular e diminuir ao máximo a porcentagem de gordura do corpo, o que pode levar o corpo a extremos limites de exaustão. Muitas vezes o resultado nunca é considerado suficiente, o que leva a pessoa a ter crises de ansiedade ou depressão, e até mesmo distúrbios físicos como por exemplo, amenorreia (falta de menstruação) nas mulheres e disfunção erétil nos homens. Em geral, pessoas com esse tipo de distúrbio simplesmente eliminam de sua dieta nutricional todo tipo de carboidrato e passam a consumir anabolizantes para “turbinar” seus treinos, colocando sua vida em risco, sem falar nos prejuízos sociais que tudo isso acarreta. Esse transtorno também ainda não está catalogado pelo DSM-5.

Fatorexia – É considerado o distúrbio oposto à anorexia no sentido de que nesse caso a pessoa está obesa, segundo os padrões dos índices de IMC (Índice de Massa Corporal – um cálculo simples para saber se a pessoa está ou não no peso ideal segundo critérios médicos) utilizados pela sociedade médica em geral, porém, ela não percebe, não se vê assim, a percepção dela é que ela está muitos quilos abaixo daquilo que o espelho mostra. O perigo dessa percepção distorcida de seu próprio corpo é que não se sabe até onde sua obesidade poderá chegar já que a pessoa não se vê doente, não procura e nem aceita ajuda médica ou psicológica. As consequências adversas para a vida da pessoa que carrega esse distúrbio, que também ainda não está no Manual DSM5, são inúmeras. Outro nome para esse transtorno é megarexia.



Drunkorexia – Também sem catalogação do DSM-5 esse distúrbio nada mais é do que o consumo de álcool em substituição a qualquer tipo de alimentação. É um jeito mais “bonitinho”, muito divulgado pela mídia, de se falar em alcoolismo. Mas na verdade, nada mais é do que isso: alcoolismo. Todo alcoólatra troca a comida pela bebida e é justamente isso que o drunkoréxico faz, embora a justificativa seja não engordar: não me alimento com comida para não engordar então eu bebo em vez de. Resultado? Viro alcoólatra. Basicamente é isso. Claro que as justificativas do indivíduo dependente de álcool podem ser um pouco diferentes do drunkoréxico. Este justifica a ingestão do álcool no lugar da alimentação normal porque está em busca do corpo perfeito, magro, segundo seus próprios critérios ou aqueles que ele julga que a sociedade exige e que ele deve cumprir. Só por isso esse distúrbio aparece na lista de transtornos alimentares. Mas no fundo, sempre que alguém deseja se entorpecer com algum tipo de droga é porque não consegue aceitar a realidade como ela se apresenta na sua vida.

Como a psicanálise pode ajudar no tratamento desses transtornos?

Primeiro é preciso deixar claro que a psicanálise não faz diagnóstico de doenças psiquiátricas como por exemplo os inúmeros transtornos sejam eles alimentares ou não. Ou seja, se você após ler este artigo se identificou com algum dos TA descritos muito sucintamente, diga-se de passagem, já que nosso objetivo aqui não é esgotar o assunto de forma alguma, sugiro que procure um médico psiquiatra. Este sim, é o profissional preparado tanto para diagnosticar doenças psiquiátricas, que os transtornos alimentares são, como medicar se for o caso.

Acontece que apenas estar medicado (e isso vale para transtornos de ansiedade, depressão e outros) não resolve. Ajuda. Mas não resolve. Então, se o seu psiquiatra for de fato um bom profissional muito provavelmente ele vai sugerir, indicar que você procure uma terapia.

E aí que a psicanálise entra.

Se você já leu meu outro artigo sobre Psicanálise, (www.guiadaalma.com), você já sabe que a matéria prima com a qual um psicanalista trabalha é o Inconsciente do paciente.

Partindo dessa premissa não espere que o psicanalista vá orientá-lo sobre reeducação alimentar, mudanças de hábitos alimentares ou algo similar. Não. Isso é assunto para nutricionistas, nutrólogos e sim, se você for diagnosticado com algum dos TA descritos aqui deve procurar ajuda desses profissionais também. Não é novidade que TA devam ser tratados multidisciplinarmente.

O que o psicanalista vai fazer então? De forma muito simplificada posso afirmar que cabe ao psicanalista ajudar o paciente a perceber, identificar, reconhecer aquilo que o faz sofrer. Lembra quando falamos da angústia? Veja, os TA nada mais são do que a ponta do iceberg, aquilo que está aparente, aquilo que é possível ver. Mas o que levou o sujeito a desenvolver essa doença? É esse garimpo emocional que o psicanalista fará junto com o paciente até que aquela angústia desconhecida deixe de ser um tesouro oculto e passe a ser algo que o paciente consegue lapidar, polir  no seu dia a dia.

Falando assim parece simples. Mas não é. Por quê? Porque é o desconhecer o que causa sofrimento, e que leva ao desenvolvimento dessas doenças, que traz dor ao paciente. Mas chegar até o veio precioso do ouro escondido por debaixo de várias camadas de terra (defesas) daquilo que foi a origem de tudo leva tempo.

Mas não é só isso. Mesmo que o paciente passe a identificar o motivo de seu sofrimento, será que ele deseja de fato se livrar dele? Essa é a pergunta de um milhão de dólares! Às vezes a dor conhecida que aprisiona o sujeito naquele lugar de sofrimento causa menos medo do que a liberdade desconhecida. É o que eu chamo de “desconforto confortável”.

Sem contar que, geralmente, num primeiro movimento, o paciente vai identificar a causa de seu sofrimento como sendo atribuída a um outro. E até ele conseguir perceber a sua parcela naquilo do que se queixa (como diria Freud) vai um bom tempo de sessões onde quem faz a “análise” é o próprio paciente. O psicanalista acolhe, escuta, pontua, mas é o paciente que ao longo das sessões vai percebendo que aquilo que ele diz que o faz sofrer é justamente aquilo do qual ele não quer abrir mão.

Sim, é o tal do desconforto confortável.

No caso específico dos TA a psicanálise não ignora os fatores socioculturais que têm levado as pessoas a desenvolverem cada vez mais esse tipo de transtorno, onde o corpo ocupa um lugar prioritário em detrimento de outros aspectos da vida humana inclusive do próprio sentido da vida.

Como diria uma historiadora e professora brasileira chamada Mary Del Priore, que defende a ideia de que hoje a história das mulheres, principalmente, passa pela história de seus corpos e com humor, observa:

“Diferentemente de nossas avós, não nos preocupamos mais em salvar nossas almas, mas em salvar nossos corpos da desgraça da rejeição social. Nosso tormento não é o fogo do inferno, mas a balança e o espelho.”

Finalizando, gostaria de reproduzir uma fala da renomada psicanalista Marina Ramalho Miranda, da SBPSP (Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo), numa entrevista ao blog dessa organização que disse:

“Será o psicanalista que irá oferecer uma escuta que se concentra na investigação do que não pôde ser dito ou do que não pôde ser ingerido (ou absorvido em excesso), do que não aparece (ou do que desnuda), do que está interditado (ou do que transborda) permanecendo desconhecido e estranho à compreensão do paciente, que por sua vez se alivia ao descobrir que seus sintomas não serão vistos como doença e sim como sinais indicativos de que algo muito sério aconteceu em algum momento de sua vida, alterando o rumo de desenvolvimento a ser seguido. A(o) paciente fala pelo corpo e com o corpo. O comer o nada ou o tudo devorar, o vomitar e expurgar são tomados como pistas a serem seguidas ou como rastros de conteúdos emocionais brutos, contraditórios, que entraram intrusivamente em seu interior e pedem para serem remastigados”.

E esse processo de “remastigação” pode ser feito através da psicanálise muito mais do que por outras terapêuticas comportamentais. Esta é também a percepção que desenvolvi ao longo de toda minha experiência clínica.

Texto originalmente publicado no site Guia da Alma em 12 de julho de 2023

https://guiadaalma.com.br/tipos-de-transtornos-alimentares/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Uma dor de barriga é sinônimo de doença incurável????

Quando Freud pedia para se dizer qualquer coisa, sabia que não é o mesmo
 que pedir para dizer uma coisa qualquer.
Quando as pessoas se sentem organicamente doentes, ou seja, quando têm dores, mal-estares físicos em geral, correm para o médico ou para a farmácia com o objetivo de aliviar aquilo que as incomoda.

Muitas vezes comentam com seus pares, colegas de trabalho, vizinhos, membros da religião que frequenta. Falam de suas dores, de seus desconfortos...parecem não se envergonhar nem do calo do dedinho do pé, nem da enxaqueca e muito menos da fibromialgia. Aliás, às vezes têm-se a impressão de que até gostam de comentar sobre suas dores físicas que, claro, sempre são maiores do as dos seus ouvintes.

Então, por que será que essas mesmas pessoas que se entopem de analgésicos comprados até em supermercados, se recusam a procurar ajuda quando o mal-estar é psíquico ou emocional? Ou seja, quando esses mesmos pares que as ouvem pacientemente, lá um dia...se viram para elas e dizem: estou te achando meio deprê; ou estou te achando meio cheio de manias; ou, parece que você está deturpando o que as pessoas te falam; ou são mais objetivas: você não está bem e precisa de ajuda....

Por que nessa hora - quando alguém lhes diz que precisam de ajuda, que devem procurar um psicólogo, um terapeuta ou nos casos mais graves, um psiquiatra - as pessoas se ofendem?

Por que a reação mais comum é dizer: o quê???? você acha que estou louca?

Por que ainda hoje, apesar de tão divulgado sobre os benefícios de uma boa análise, uma boa terapia...por que, as pessoas acham que estão querendo dizer que elas estão loucas quando se sugere procurar a ajuda de um profissional da alma? 

Porque se essas mesmas pessoas  reclamam de uma dorzinha abdominal e alguém lhes diz para ir ao médico elas não respondem defensivamente: Você pensa que eu estou com câncer? Uma dor de barriga é sinônimo de doença incurável? Não necessariamente. Então, não necessariamente é louco todo aquele que, embora doente da alma, procura um analista, psicólogo ou psiquiatra!

Então, por qual motivo inconsciente e inconsistente, homens e mulheres fogem dos analistas, psicoterapeutas e terapeutas em geral como o diabo foge da cruz, como o vampiro foge do alho, como o lobisomem foge da bala de prata?

Bom, se não procurarem uma ajuda imediatamente nunca saberão!

quinta-feira, 15 de março de 2012

Depressão será o segundo maior problema de saúde pública em 2020

Dados da OMS indicam que 75% das pessoas com depressão não recebem tratamento adequado

Universidade São Francisco, em Bragança Paulista (SP), oferece curso de pós-graduação para formar profissionais mais bem habilitados a medicar de forma correta

A depressão e os problemas relacionados à doença é um dos males que mais afligem a população, gerando várias vítimas anualmente em todo o mundo. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a enfermidade afeta cerca de 340 milhões de pessoas e causa 850 mil suicídios por ano em todo o mundo. Somente no Brasil, são cerca de 13 milhões de depressivos. Atualmente, a depressão é apontada como a quinta maior questão de saúde pública pela OMS, sendo que até 2020 deverá estar em segundo lugar.
 “O mais perigoso desses números são os dados da própria OMS, os quais refletem que cerca de 75% das pessoas com depressão não recebem tratamentos adequados e específicos. É diante de uma questão complicada como esta que precisamos especializar profissionais da grande área da saúde na prática clínica, mediante a avaliação crítica da eficácia e segurança dos medicamentos”, afirma Prof. Dr. Carlos Eduardo Pulz Araujo, Coordenador do Programa de Pós-Graduação Lato sensu em Farmacologia Clínica da USF (Universidade São Francisco).
 Ofertado nos Campi Bragança Paulista e Campinas, o Curso de Pós-Graduação em Farmacologia Clínica da USF tem o objetivo de formar profissionais que aprendam a minimizar riscos e custos por intermédio de uma terapêutica medicamentosa racional fundamentada na medicina baseada em evidências.  O especialista poderá atuar em hospitais, farmácias privadas, UBS (Unidades Básicas de Saúde), indústrias farmacêuticas, consultórios, clínicas e empresas de pesquisa e desenvolvimento na área farmacêutica.
 As inscrições já estão abertas. Para saber mais, acesse:  http://www.usf.edu.br/especializacao.


 

Deixando o Rancor de Lado: Cultivando a Liberdade Interior

O   rancor é um sentimento negativo que pode prejudicar nossa saúde mental e nossos relacionamentos. Abaixo, apresento algumas estratégias ...