"UMA
PERSPECTIVA ARQUETÍPICA SOBRE A AMIZADE
Pessoas fortemente influenciadas por padrões
arquetípicos distintos que ocupam o assento de poder também têm padrões de
amizade distintos.
Zeus |
Por exemplo, homens do tipo Zeus, que usam o escudo de
poder, não procuram amigos de alma, nem entre os homens nem entre as mulheres.
Incapazes de compartilhar o poder ou trocar sentimentos profundos, eles têm uma
atitude mais utilitária sobre as pessoas. Os homens de Poseidon também procuram
dominar os outros, mas com um poder emocional em vez de um poder político.
Tendem a competir com homens e mulheres, tornando a intimidade difícil. Quando
um personagem Hades está presente em um homem, ele terá dificuldades em fazer
amizades, mas por outra razão: sua profunda introversão. Um homem tipo Ares,
por outro lado, é um companheiro de outros homens, especialmente nas forças
armadas ou como membro de um time, onde a agressividade natural é honrada. E um
homem tipo Dioniso é um companheiro das mulheres, que tendem a adotá-lo como
amigo e nutri-lo, sentindo-se apreciadas por ele. Quando Apolo é forte em um
homem, ele é capaz de amizade com mulheres independentes e competentes,
especialmente aquelas que compartilham sua paixão por música e arte; mas com
outros homens fica competitivo e precisa liderar. Finalmente, quando Hermes
influencia um homem, ele é amistoso, espontâneo e comunicativo, encantando as
mulheres e unindo os homens em suas atividades. Mas Hermes é também um
solitário, que chega e parte sem se comprometer. E pode mentir e enganar para
conseguir o que quer.
Apolo |
Uma mulher altamente influenciada por Ártemis
tende a valorizar os amigos mais que os amantes, formando vínculos de
fraternidade com mulheres, o que pode incluir grupos de apoio e o espírito
coletivo da irmandade, e também com homens, especialmente aqueles parecidos com
seu gêmeo Apolo, o deus andrógino da música e da profecia. Atena, por outro
lado, tem poucas amigas mulheres; sua racionalidade e sua natureza competitiva
levam-na a ignorar o parentesco com as mulheres e se colocar ao lado dos
valores patriarcais. Ela é atraída por homens heróicos e poderosos, como amigos
e colegas, e pode agir como conselheira ou confidente.
Afrodite |
Quando Hera está na cabeceira da mesa, as
mulheres também desvalorizam as amizades com as outras mulheres, colocando suas
prioridades no casamento. Como esposas, elas desprezam a mulher solteira, que
consideram um fracasso, ou então a enxergam como uma ameaça à sua própria
segurança. Quando Deméter está presente em uma mulher, ela valoriza a
maternidade acima de tudo, e portanto gosta de amizades com outras mães, para
ter apoio emocional. Talvez seja amiga de uma mulher jovem e ingênua, tipo
Perséfone, para continuar o padrão de tomar conta de alguém. Ou de um homem
jovem e sensível que precisa ser nutrido por uma mulher maternal. Por último, a
mulher estilo Afrodite tem amizades problemáticas com os dois sexos. Desejada
pelos homens por sua sensualidade erótica, ela tem o hábito de se tornar amante
e não amiga. As mulheres não confiam nela exatamente por esta razão, e ela
costuma despertar ciúmes, inveja e sentimentos de perigo, especialmente nas
mulheres do tipo Hera. Ela pode estabelecer vínculos com mulheres, mas estas ou
se sentirão subordinadas aos seus poderes ou precisarão desenvolver sua própria
autoconfiança.
Existe um padrão de amizade que tem o potencial
de curar o vínculo pai/filho: o padrão senex-puer/puella
- isto é, amigo mais velho-amigo mais novo. Como o puer vive em um mundo de idéias, ele ou ela anseiam por pessoas
especiais que possam ser chamadas de amigos. Quando um vínculo é formado, o puer tende a se fundir com o Outro derretendo
as fronteiras, talvez chamando Afrodite e usando a sexualidade como um meio de
se conectar, ou evocando uma conexão espiritual Self a Self, que pode não
respeitar limites individuais ou mundanos.
Uma pessoa controlada por este padrão não tem
um pai interno, por isso o amigo pode cumprir esta função do lado de fora, sob
a forma do amigo do tipo pai ou mentor, isto é, um senex positivo. Como o sábio vidente Merlin para o jovem rei Artur,
o senex inicialmente funciona como um
professor ou guia, e finalmente se torna um amigo de alma. Na lenda, Merlin
ajuda o menino a cultivar sua masculinidade com a ajuda da espada Excalibur,
iniciando-o portanto no ofício de Rei - isto é, na relação adequada entre o ego
e o Self. Os homens e mulheres que são afortunados o bastante para encontrar
este tipo de amigo sábio podem experimentar o próprio sentido de inteireza, se
não continuarem a projetar toda a estabilidade e sabedoria fora de si mesmos.
• Que mitos e imagens arquetípicas estão por
trás de suas amizades? Como elas enriquecem as amizades? Como interferem nelas?
MULHERES
E HOMENS COMO AMIGOS: PERIGOS E DELÍCIAS
Homens e mulheres talvez possam encontrar
verdadeiras amizades da alma entre si, mas os obstáculos no caminho deste
tesouro são inúmeros. Por exemplo, se levarmos para estes relacionamentos nossa
bagagem estereotipada, esperando secretamente que todos os homens sejam
heróicos, racionais e competentes, ou que todas as mulheres sejam acolhedoras,
emocionalmente acessíveis e subordinadas, então toda a extensão de nossa
autenticidade não poderá ser expressa. Em vez disso, nossa identificação
infantil com os padrões de um "filho do pai" ou de uma "filha da
mãe" serão reforçados, a variedade emocional reduzida, e os personagens de
sombra silenciados.
Os especialistas nos gêneros masculino e
feminino, Aaron Kipnis e Liz Herron, mostram que muitos homens encobrem sua
vulnerabilidade com os escudos da riqueza e do poder, para serem aceitos. E as
mulheres, por sua vez, freqüentemente encobrem seu poder legítimo, usando um
escudo de vulnerabilidade, também para serem aceitas. Desta forma, os membros
dos dois gêneros perpetuam os mitos arcaicos do herói e da princesa, ou do
algoz e da vítima. Assim, a necessidade de carinho dos homens, juntamente com
sua depressão e impotência, permanecem na sombra, enquanto a competência, a
autoridade e a violência das mulheres também permanecem ocultas.
Algumas amizades com o sexo oposto podem
compensar elementos ausentes nos relacionamentos primários. Por exemplo, Doug
tinha uma animada troca intelectual com sua amiga Célia, uma "filha do
pai" que ele conhecera fazendo pós-graduação. Em seu casamento com uma
artista, Doug estava bastante satisfeito, mas depois de voltar para a
universidade desejou mais estímulo intelectual. Claramente, o perigo aqui é a
triangulação: Sua mulher pode se sentir inadequada ou abandonada, proibindo o
relacionamento, ou Célia pode ser incapaz de tolerar os limites da amizade.
Qualquer amizade entre um homem e uma mulher, na qual um dos dois é casado, vai
exigir uma solução para este problema potencialmente sombrio.
Amigos desde a infância... |
A sexualidade complica, e muitas vezes coloca
em perigo, as amizades entre homens e mulheres. Se os dois sabem com certeza
que não desejam formar um par romântico, as probabilidades melhoram. Mas muitas
vezes um dos dois se torna vulnerável, com as flechas de Eros enterradas no
coração, e então são despertados perigosos desejos sexuais secretos.
Allen, vinte e nove anos, fazia terapia já há
vários anos para explorar seus relacionamentos com mulheres, quando finalmente
decidiu falar sobre sua melhor amiga, Tanya, vinte e oito anos. Amigos desde a
infância, faziam confidencias um ao outro e iam a jantares e a cinemas juntos.
Tanya até ajudou Allen a escolher móveis e decoração para a casa. Quando Allen
saía com outras mulheres, dava a Tanya "poder de veto", respeitando
suas opiniões e confiando que ela desejava o seu bem. Muitas vezes, quando ele
se sentia solitário e os dois estavam juntos, Allen imaginava que um dia a
convidaria para um envolvimento romântico com ele. Mas nunca havia contado esta
fantasia proibida à sua melhor amiga.
Allen estava saindo com June há vários meses
quando confidenciou ao terapeuta que não contara a Tanya que seus sentimentos
por June eram cada vez mais fortes. Em vez disso, ele se comunicava mais
abertamente com June, experimentando pela primeira vez uma relação sexual com a
autenticidade que ele sempre reservara para a amizade. Sentia-se culpado, como
se estivesse traindo a amizade com Tanya, ao recusar-se a compartilhar com ela
uma parte tão importante de sua vida. Mas não tinha vontade de contar esses
novos sentimentos para ela. Tinha medo de que ela se sentisse usurpada, e pavor
de que ela se tornasse crítica. Além disso, confessou que se sentia responsável
pelos sentimentos dela.
Ao dizer isso, Allen percebeu que transformara
sua amiga em mãe, projetando em Tanya a voz crítica da mãe e se achando na
obrigação de agradá-la. Se contasse isso a ela, precisaria resgatar a voz
crítica, retirando-a da amiga, e portanto declarando sua independência em
relação a ela. Talvez então pudesse esclarecer os sentimentos sexuais que
evitara por tanto tempo. Ou poderia aprofundar o relacionamento com June sem se
sentir culpado por abandonar Tanya.
Nos mitos, como na vida, existem poucos modelos
da amizade homem-mulher. Mas na Grécia antiga, onde a amizade masculina era
valorizada e as mulheres consideradas propriedade dos maridos, havia uma única
exceção: a hetaira, cuja raiz, heter, significa
amizade em egípcio. Uma
mulher hetaira era uma companheira dos homens, e propriedade de ninguém. Ao
contrário das esposas, ela era livre para ir à escola, ler os céus estrelados,
velejar nos mares bravios, recitar os grandes poetas, e fazer sacrifícios aos
deuses. A hetaira muitas vezes era dona de um salão, onde participava da vida
intelectual dos homens. Ela, entre todas as mulheres, era uma igual.
Toni Wolff, que fez o papel de hetaira de Jung,
e também de amante, descreveu este padrão arquetípico nas mulheres: Ela
estimula os interesses e inclinações dos homens, dando a eles um sentimento de
valor pessoal e conduzindo-os além das responsabilidades cotidianas, para uma
vida interna mais rica. Se ela o tocar fundo demais, ele pode abandonar o
trabalho e sacrificar a segurança, ou mesmo buscar o divórcio, achando que ela
o compreende melhor do que a esposa.
Hoje, também, algumas mulheres são basicamente
intelectuais ou companheiras espirituais dos homens, em vez de fêmeas. Elas
colaboram nos seus projetos, acendendo o fogo da criatividade em vez do fogo do
desejo. Elas inspiram os homens a ter uma vida interior, mas em geral não são
escolhidas como parceiras. Cheryl, a amiga de Gabriella mencionada antes,
percebeu que os homens queriam sua companhia e seus conselhos, mas não a
queriam sexualmente. Ela sofreu, em parte, por ser uma hetaira em um mundo cego
para este tipo de beleza; uma hetaira em um mundo que não conhece mais esta
palavra.
Talvez, ao darmos um nome a este tipo de
amizade, possamos reimaginar mulheres e homens juntos, em novas formas. Talvez existam
homens hetairas que inspirem as mulheres em suas vidas criativas, para que
possam se livrar da limitação dos padrões antigos de desigualdade, descobrindo
juntos uma nova forma de amizade.
• Você tem um amigo de alma do sexo oposto? Se
não, qual é o personagem de sombra que está impedindo?"
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