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segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

A virtude como ela é: sem graça, seca, triste e neurastênica

Quando assisto a um filme como Relatos Selvagens, dirigido por Damián Szifron e produzido por ninguém menos do que os irmãos Pedro e Agustín Almodóvar, penso que Nelson Rodrigues não morreu (aliás, Pedro Almodóvar deve ter lido ou visto Rodrigues em algum momento de sua vida tamanha semelhança dos seus argumentos eróticos passionais com os do brasileiro). Para quem não sabe quem é Nelson Rodrigues sugiro uma olhada breve no Wikipedia da vida, mas já adianto que uma biografia bacana desse gênio do jornalismo e da literatura contemporânea é O Anjo Pornográfico, de Ruy Castro.

O que há em comum entre o filme de 2013, estrelado por um elenco maravilhoso encabeçado por Ricardo Darín, e as histórias de NR, que viveu e escreveu sobre a sociedade provinciana das décadas de 50 e 60 do Rio de Janeiro?

Eu diria que quase tudo. A violência, a paixão exagerada, a raiva incontida, o medo, a impotência, o poder...o amor!

E o humor negro que os críticos acentuaram em Relatos e que provavelmente levou à morte os chargistas do Charlie Hebdo (o filme está repleto de ironias e sarcasmos também).

Um humor que de tão cruel (e cruel porque sem retoques, sem filtros) até nos faz rir, porque rir acaba sendo uma válvula de escape, uma catarse para a tensão tão bem conduzida em todos os episódios.

Nelson também costumava escrever pequenas historietas semanais que acabaram virando livros e minisséries da TV, anos mais tarde (A Vida Como ela É, da Globo, sucesso de audiência no tempo que a Globo possuía um padrão de qualidade), apresentando o ser humano com toda sua frágil e às vezes obscena humanidade.

Em Relatos um psicótico reúne seus desafetos num mesmo avião. Quem nunca desejou fazer isso? de brincadeira, nas rodinhas do café na firma, quantas vezes não dissemos que colocar toda a chefia num cargueiro rumo à Sibéria, sem direito a retorno, era uma boa ideia? que atire a primeira pedra!

Num outro momento dois motoristas vão às últimas consequências porque um provocou o outro na estrada, um mostrou o dedo para o outro, um mostrou poder antes da hora e na hora H amarelou....quem nunca?

Em outro, um pacato cidadão vira herói depois de explodir seu próprio carro num estacionamento de veículos guinchados. Quem nunca pensou em mandar pelos ares todo o aparato burocrático que nos atormenta a vida com multas, cobranças, impostos altíssimos e injustiças de toda ordem?

Um jovem playboy atropela uma mulher grávida e foge sem prestar socorro! Fato comum nas grandes cidades. A impunidade, o poder do dinheiro que aparentemente tudo resolve...

A justiça feita com as próprias mãos quando a vítima encontra seu algoz...

Enfim, o filme não questiona nem julga. É às vezes assustador, às vezes nojento, às vezes engraçado, ridículo ("porque a dor tem de ser necessariamente ridícula", diria Nelson). Mas nunca enfadonho ou cansativo. Nunca ideológico ou doutrinador.

Apenas nos mostra o ser humano exatamente como ele é: nem bom nem mau, nem certo nem errado; apenas humano.

Quem nunca pensou em resolver seus pequenos problemas cotidianos exatamente do mesmo modo que os terroristas do Estado Islâmico resolveram o deles matando os jornalistas do Charlie Hebdo que ousaram não ter medo de fazer valer o direito supremo à liberdade de expressão? 

Sim, está na mídia todos os dias: algumas pessoas fazem isso com os gatos da rua. Com mendigos, com prostitutas, com homossexuais, travestis, velhos, mulheres e crianças...

Traficantes eliminam seus maus pagadores à bala. Políticos corruptos não titubeiam em roubar o leite das criancinhas da creche, a pensão das viúvas, a aposentadoria dos velhinhos...

O filme aborda questões relacionadas a pessoas que atravessaram o limite de situações-limite quando todos os argumentos se esgotaram! Daí o nome. Selvagem porque deixadas levar por suas raivas mais atávicas, profundas, arraigadas, grudadas no coração feito limo antigo na pedra.

E o episódio que encerra o filme é bem mais a cara de Nelson Rodrigues, é verdade, por ser mais passional (bem passional!). Uma traição, claro, é o estopim de tudo! E o resultado da descoberta dessa traição....só vendo o filme, mas posso garantir que é bem rodriguiano o desfecho. O filme é tão bom que vale a pena ver até na fila do gargarejo (geralmente o pior lugar dos cinemas), como aconteceu comigo, que cheguei em cima da hora e encontrei os dois últimos lugares!

Agora, se você nunca viu a minissérie da Globo ou se quer refrescar sua memória clique no link a seguir e...divirta-se com o episódio Casal de Três, uma espécie de continuação do post anterior Porque só faço com você, só gosto com você, adivinha o quê!, que vai ensinar que "a virtude é triste, seca, amarga e neurastênica"! E que "a melhor esposa do mundo é a que trai o marido com metade do Rio de Janeiro" (teoria de Nelson Rodrigues, claro! por favor, sem julgamentos!)


Casal de Três 

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