
Minutos antes de sentir a fisgada da inflamação na garganta, como se um anzol enganchasse nas suas amídalas, ela ouvira um "cala essa sua boca", que a pegou de surpresa, como um soco do boxeador no adversário distraído.
Não quis acreditar que aquele "cala a sua boca" tivesse sido desferido pelo seu preferido.
Melhor fingir que a grosseria fora desencadeada por absoluta falta de escolha mais adequada de palavras?
Mas Matilde se acostumara às grosserias. Todos os seus relacionamentos acabaram em violência verbal ou física. Essa maldita força demoníaca era invocada inconscientemente e arrastava tudo o que estava ao redor. Vivera assim, no olho do furacão.
Ela, Matilde sabia: vai começar tudo outra vez. Ela, de novo, se posicionava ali, no altar do sacrifício, pronta para a degola. Sabia que seria acusada de provocar a ira dos deuses e sentiria a culpa cotidiana. E pediria perdão por ser assim.
Essa era sua marca tatuada na alma. Enquanto o som do recente "cala essa sua boca" ardia ainda nos recantos do canal auditivo, Matilde pensava: esse não era um cala a boca qualquer.
Desta vez seria um "cala essa sua boca" definitivo. O primeiro e o último dessa relação tobogã.
Tinha gosto de ponto final sabor menta com romã."
(Lady Lou - 23/10/2016)
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