quarta-feira, 23 de setembro de 2020

A CLARIDADE ESTÁ NA OBSCURIDADE (destituição subjetiva, provérbios e jogo de significantes)



EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA SOBRE TUDO

EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA SOBRETUDO

EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA SOBRE

EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA SOB

EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA S

EU NÃO TENHO OPINIÃO FORMADA

EU NÃO TENHO OPINIÃO 

EU NÃO TENHO 

EU NÃO 

EU 

**********

O real não está onde se espera.

Não na guerra, mas no vidro quebrado.

Não na doença, mas em um esboço de dor.

Naquilo que está relacionado com o furo, com a falta, deficiência.

No "desser" e não no ser.

**********

O real está na falta.

A claridade está na obscuridade.

Um termo pode significar seu contrário: oposição entre ideia e coisa.

"Toda palavra é uma ideia, toda ideia é uma coisa, toda coisa é uma palavra" (O Desejo e sua Interpretação, pág. 421).

**********

"Devido ao fato de o significante ser polissêmico é que o sujeito pode sustentar além daquilo que ele acredita querer dizer, e com as mesmas palavras, um discurso completamente diferente".

**********

"As dores Imaginárias", em O Guerreiro Aplicado, de Jean Paullhan

O ICs reúne os contrários e representa-os em um só objeto (Freud)

**********

Conceito de falo: 

em Freud esse conceito permite a equivalência de termos aparentemente díspares, como a criança e as fezes.

Funciona como significante do desejo, tanto em um sexo como no outro (enquanto não se reduz ele próprio a um órgão).

é símbolo, no ICs, tanto do interdito como do desejo,

A cada vez, reúne os contrários.

**********

A Psicanálise leva o sujeito ao encontro com um objeto que constitui, para ele, o real, um objeto certamente bizarro o bastante para que Lacan tenha precisado inventar-lhe um nome: objeto a.

Eu sou objeto a? O objeto a sou eu.

Essa descoberta tem um efeito - destituição subjetiva: o sujeito não é o que imaginava, não é o que pensava,

ELE É ONDE NÃO PENSA

**********

em "O Guerreiro aplicado" - perlaboração - parágrafos curtos, fragmentados, frases transparentes, pelas quais pode passar a lua.

"A condição da força sustenta-se em uma certa fraqueza".

Onde creio que minhas dores sejam imaginárias, que as invento, dou-me conta de que elas são reais.

Elas me sentem quando eu, na verdde, acreditava que as sentia.

Onde acredito ter ideias, são as ideias que já me elaboraram: sou feito."

**********

É no assujeitamento que o sujeito pode apreender-se. É nessa destituição, nessa falta a ser, que ele pode, finalmente, encontrar sua realidade: acreditava-se ativo, era passivo; apreendendo o que o constituía sua passividade, pode, enfim, agir.

**********

Pudor - qualidade para os analistas

Pudor é, em primeiro lugar, uma recusa.

É pudico o homem que mantém à distância suas emoções, sua vontade, seus desejos. Que os trata pelo mistério, sendo belo, dissimula seu corpo; forte, sua potência; enamorado, seu desejo.

Seria bom que o analista também fosse pudico.

Em que sentido?

Não demonstrando seus sentimentos: isso é fácil, ele o aprendeu e chama de neutralidade, esse seu ar de não se deixar abalar; não exibir muito seus pensamentos ou suas opiniões, assim como para qualquer pensamento que o atravesse, antes mesmo de produzi-los. Então, talvez o mais difícil e, ao mesmo tempo, o mais essencial, seja tampouco exaltar em si próprio o assujeitamento.

**********

A dor sente-me e o significante comanda-me.

**********

"A experiência do provérbio e o discurso psicanalítico".

"Désêtre" (des-ser), neologismo introduzido por Lacan para dar conta da queda do sujeito suposto saber do lado do analista como correlato da destituição subjetiva do lado do analisante.

Trata-se da queda da consistência (do ser) do analista na situação de fim de análise e passagem do analisante para a posição de analista. Esse termo é empregado por Lacan no discurso proferido  sobre o passe na École freudienne de Paris, em 1967.

**********

"A experiência do provérbio e o discurso analítico".

A essência da linguagem é o mal-entendido (o mal sabido?).

**********

A pulsão e o fantasma são dois intermediários. Entre o inconsciente e o consciente quais são

as leis que presidem a formação e a estruturação da pulsão e do fantasma?

o artigo "As lembranças encobridoras", é pela virada ao avesso que Freud estabelece o "fantasma" por trás da lembrança, "levar flores a uma jovem", significando "tomar-lhe sua flor, deflorá-la".

Da mesma forma, a interpretação do fantasma clássico "bate-se em uma criança" gira em torno da virada ao avesso do GESCHLAGEN [bater], um pouco como se aplicasse o provérbio - "quem ama bem castiga bem", ou seu inverso - "quem bate muito gosta muito, ou ainda, "quem bate bem beija bem."

Freud diz: "...o estudo dos provérbios não seria o último a nos esclarecer a respeito do virar ao avesso",

**********

metáfora: analisante mulher tem um medo obsessivo do que pode sair da boca do analista - o pênis? ele interpreta. Ela rechaça, até que ele cita um provérbio japonês: "o cego não tem medo de serpentes".

"O nervo da metáfora está na substituição como tal" e não nos termos que são substituídos um pelo outro."

Assim, no paciente o desejo acha-se "reconhecido como tal, i.é., reconhecido sem ser conhecido."

a diferença entre "você não quer ver a verdade" e "o cego não tem medo de serpentes" é a diferença entre o imperativo "você deve saber" e o convite "você pode saber",

**********

Enquanto insistia em fazer sua paciente admitir sua interpretação, o analista mantinha com ela uma relação dual. A relação imaginária do eu (MOI) com o outro, constituía uma barreira para que surgisse o que quer que fosse do ICs.

Para que tal possibilidade seja aberta é preciso ir além do eu (MOI) assim como do VOCÊ. O ICs como discurso do Outro tem essa dimensão que (Moustapha) Safouam designa como dimensão do ELE.

Porém, é inessencial que seja a enunciação de um provérbio que opere esse apagamento da pessoa do analista, correlativo de um discurso que não se dirige mais a um outro, mas ao Outro?

**********

questão essencial para um psicanalista: " a pressão paradigmática" - Para Octave Mannoni (A elipse e a barra) trata-se de saber como funciona efetivamente, na análise, o significante com seus equívocos, suas próprias leis de homofonia e o que elas induzem.

**********

Paciente cuja esposa chama-se Laurence e a irmã Florence acha que não  há mais semelhança entre elas do que entre um OEUF (ovo) e um BOEUF (boi).

Para Mannoni o importante é que quando o paciente pronuncia essa frase, é que a homologia das relações, por um lado entre oeuf e boeuf e Laurence e Florence.

Não é isso que surpreende o analisante e sim o provérbio - Quem rouba um oeuf rouba um boeuf certamente ele já havia notado a semelhança entre os nomes sem dar a isso a devida importância e, ainda desta vez, sem dúvida, não teria sido surpreendido pela semelhança significante, pela analogia literal, se não fiosse o provérbio.

"o jogo com os significantes não se manifesta no discurso neurótico senão quando algo de recalcado é posto em questão (se quem rouba um oeuf rouba um boeuf, quem deseja Laurence pode muito bem desejar Florence).

O sentido de um provérbio não é apenas seu sentido aparente, depende do contexto em que foi empregado.

**********

Provérbio - é preciso lembrar não da imagem, e sim da frase inteira, como se ela fosse apenas uma única palavra.

O provérbio só funciona bem com a condição de não ser tido por provérbio.

Cada provérbio deveria ser tomado como um significante, enigmático enquanto tal e em relação ao qual toda significação só poderia ser secundária.

Todo o problema seria ver como os sujeitos falantes - os falaseres - podem acomodar-se com esse significante, tomando-o por sua conta, comentando-o, dando-lhe sentido.

**********

O que acontece quando um sujeito choca-se  com o significante? O que ele percebe em primeiro lugar?

- que está dele excluído (faltam peso e valor às suas palavras).

Há "no interior da língua comum"..."uma segunda linguagem esotérica".

Linguagem comum - poderia estar imajada, mas a imagem, inessencial, jamais é percebida como tal. Quando sabe diz que "o boi morto não se defende das moscas", ele não se compara a um boi, não coloca em relação a sua própria imagem a um boi morto. Onde não se está na ordem da significação, todo imaginário é neutralizado.

(trecho de anotações, não sei de que aula, seminário ou estudo, nem de quando. É curioso porque, em geral, costumo anotar datas, nomes e locais...mas, para não perdê-las, registro-as aqui. Poderá ser útil a mais alguém. A mim, me foi bastante.)



segunda-feira, 3 de agosto de 2020

O que acontece quando você se enamora?

 
Basicamente Freud vai dizer que cada indivíduo possui um jeito particular de se relacionar eroticamente, jeito esse resultado de algo inato nele mais as experiências e influências dos primeiros anos, isto é, "nas precondições para enamorar-se que estabelece, nos instintos que satisfaz e nos objetivos que determina a si mesmo no decurso daquela (A Dinâmica da Transferência - vol. 12 - página 111 - Obras Completas Imago).
Ao longo de sua vida o indivíduo vai repetir esse padrão de enamorar-se que é o padrão aprendido lá atrás com sua mãe e "que decerto não é internamente incapaz de de mudar, frente a experiências recentes" (idem pág. 111)
 
Uma parte desses impulsos do "enamorar-se - que determinam em nível consciente, faz parte da realidade. Outra parte, porém, fica retida, afastada da personalidade consciente e da realidade, e impedida de se expandir, a não ser pela fantasia, ou permanecem totalmente no inconsciente, de modo que é desconhecida pela consciência da personalidade.
 
Se a necessidade que alguém tem de amar não é inteiramente satisfeita pela realidade, "ele está fadado a aproximar-se de cada nova pessoa que encontra com ideias libidinosas antecipadas; e é bastante provável que ambas as partes de sua libido, tanto a que é capaz de tornar-se consciente quanto a inconscinete, tenham sua cota de formação dessa atitude."

É importante observar que Freud está nos avisando, grosso modo, do seguinte: seu paciente vai repetir com você, analista, as formas dele de amar. A isso Freud chamou de "transferência, ou seja, a pessoa transfere para o analista o amor que possui e, de certo, .espera que seja retribuído.

E, claro, o bom analista, bem analisado, saberá manejar essa demanda para que isso não se transforme numa contra-transferência, sempre norteado pela ética psicanalítica.

domingo, 2 de agosto de 2020

O que atrai é o mesmo de separa

"O que é o amor?

E o que é o sexo?

Não são parte do mesmo fenômeno, muitas vezes antagônico?

Quando nascemos, ocorre uma mudança para pior. É o fim da harmonia. É a expulsão do Paraíso, nosso Big Bang foi no encontro do espermatozoide com o óvulo.

Levamos um tempo, às vezes a vida toda, para nos adaptarmos ao novo mundo cheio de ameaças, desconforto e desamparo.

E aí começa a sensação de que para que tenhamos algo parecido com aquele aconchego uterino precisamos nos acoplar (de cópula mesmo) a uma outra pessoa, que vai substituir o primeiro objeto de desejo de todos nós: a mãe!

Nossos amores giram em torno disso. Se nosso companheiro não nos proporciona esse "aconchego", conforme essa memória uterian, trocamos por outro que, supostamente, fará essa função, e vamos trocando sempre que entendermos que o outro não nos dar aquilo que entendemos sermos merecedores.

O amor é um remédio para a sensação desagradável de desamparo. É a sensação agradável que deriva do fim da dor ou do desamparo.

"Os homens se atrapalham muito quando tentam juntar sexo com amor. O que deixa as mulheres perplexas!"

Não se pode tomar a sexualidade como referência da qualidade da relação. A maior parte dos casais que se dão bem têm uma vida sexual relativamente pobre. Igualmente não se pode tomar a sexualidade como indicativo do que vai acontecer no futuro.

O amor deriva da admiração (Platão).

O problema é que os critérios dessa admiração vão sofrendo alterações com o passar do tempo (ou da cultura etc, entre os islâmicos os critérios são uns, católicos, outros, asiáticos, ocidentais, etc)

O que pode acarretar o colapso amoroso da relação a qualquer instante. A pessoa é legal, mas aquilo que eu achava legal não acho mais. O sentimento amoroso vai despencar pela mesma razão que um dia ele subiu.

Vou me desencantar pelas mesmas razões que um dia me encantei.

E, ATENÇÃO! quanto mais baixa minha autoestima mais vou me encantar pelo meu oposto!

Aquela história de que os opostos se atraem, como se isso fosse algo positivo, é propaganda enganosa! Muita atenção!

O fim do amor não é necessariamente o fim imediato do relacionamento conjugal. Existem milhares de casais, principalmente na maturidade, que con vivem relativamente bem, sem necessariamente se amarem e muito menos fazerem sexo.

Ah mas eles nunca vão se separar? Pode ser que sim, pode ser que não.

A separação, se acontecer, vai acontecer em decorrência do mesmo motivo que houve o casamento."

(este texto são anotações minhas feitas durante algum seminário do qual eu não me lembro o nome, nem quem o proferiu, por isso coloquei entre aspas. Sorry. Fazendo umas arrumações em armários, cadernos, livros etc encontrei várias anotações como essa, sem data, sem referências precisas... e para que elas não se percam completamente vou compartilhar aqui e no meu blogue que anda meio abandonadinho. LMR)


terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Toda mulher sabe sempre duas coisas

Há 35 anos nascia Patrick. Gertrudes tem certeza de que ele foi concebido no dia 12 de junho de 1985. Por quê? 
Primeiro porque toda mulher sabe sempre duas coisas: quem é o pai (já dizia Freud...) e quando fica grávida. 
Por isso ela achava muito bizarras as cenas de novelas ou filmes onde a mocinha desmaia e...pimba! "descobre" que engravidou. 
"Ora bolas", dizia Gertrudes para as filhas adolescentes, Emma e Monique, do primeiro casamento: "Primeiro sinal de gravidez é a falta da menstruação, óbvio! E o principal: se você transou sem proteção, ou seja, sem nenhum tipo de contraceptivo, suas chances de engravidar são de 99%". Simples assim, raciocinava a pragmática dona de casa de quase 40 anos.
Na noite em questão, conta Gertrudes que o pai do Patrick chegou de surpresa. Como assim, chegou de surpresa? 
Explico: na época, a família Durand morava numa pequena cidade no interior e Jean Pierre, pai de Patrick, passava a semana toda na capital a trabalho. Só ia para casa nos finais de semana. 
Como era Dia dos Namorados, porém, ("uma quarta-feira, me lembro até hoje", disse) o romântico marido apaixonado resolveu aparecer de surpresa e ainda trouxe na mala uma lingerie sexy de presente para sua Gertrudes. Gertrudes que, nesse tempo, havia justamente abolido o uso de pílulas anticoncepcionais depois de um escândalo envolvendo um grande laboratório farmacêutico que vendia pílulas falsas. 
Além disso, como ela se protegia dessa forma há mais de 10 anos, havia decidido, por orientação médica, a utilizar outro tipo de contraceptivo, menos tóxico, como a camisinha.
Acontece que Jean Pierre, assim como 99% dos homens da sua geração, odiava usar camisinha. E ela, assim como 99% das mulheres da sua geração, das anteriores e das posteriores, tinha uma certa dificuldade em dizer "não" para o desejo do outro. 
O resultado dessa combinação faz aniversário hoje.

"Eu soube na hora: fiquei grávida", lembra Gertrudes com um sorrisinho maroto. "Duas semanas depois, o primeiro e fatídico sinal: nada de menstruação". 
Mas, mesmo não tendo planejado, diz ela que ficou feliz e que teve outra certeza: a de que desta vez era um menino! "De cara pensei no nome: Patrick".
De fato, a convicção era tanta que contou a novidade para as meninas antes mesmo de receber a confirmação do laboratório sobre seu estado interessante:"Disse que elas teriam um irmãozinho, o Patrick". Segundo ela, as garotas vibraram de alegria! 
Emma, a mais nova, teria perguntado: "Mamãe, mas como você sabe disso tudo?". 
Gertrudes teria respondido: "Não sei como sei. Só sei que sei".
Dessas certezas antissocráticas que só as mulheres possuem...    

domingo, 20 de outubro de 2019

De volta para o futuro

Nem me lembrava! Repertório Feminino tem DEZ anos.


Comecei aqui em julho de 2008. Acabara de ser demitida de um hospital onde trabalhei por longos 18 meses e havia começado numa loja de objetos de decoração como vendedora. Pertinho de casa. Num dos primeiros textos eu comentava exatamente sobre as delícias de trabalhar perto de onde se mora.
Em outubro fui pra Editora Três e lá fiquei até abril de 2015. Nesse meio tempo fiz uma formação em psicologia analítica e dei início a outra de psicanálise, ofício que exerço atualmente praticamente em tempo integral.



Fiz vários outros cursos, mas de verdade, hoje vivo de psicanálise e complemento minha renda com alguns frilas de revisão.


Em 2015 fiz minha primeira oficina de escrita literária na Casa Mário de Andrade com o escritor Luiz Bras.

A oficina acabou resultando numa coletânea de contos do gênero literatura fantástica, o que dá para perceber a partir do próprio título da obra:
Um Circo de Percalços Falsos: Guia para a bibliotecária das galáxias


Era o coletivo literário As Lontras Daquela Hora, que foi nascendo a partir da contribuição de todos os escritores. E quando digo todos não é apenas uma expressão de retórica. De um conto surgia a ideia de outro, aproveitava-se o personagem ou seu dilema, e assim foi-se desenhando o cenário das desventuras de Manu, da Velha, dos fantasmas da biblioteca Mário de Andrade...aliás, minha participação foi com o conto  "Depois eu conto" sobre a estátua Literatura que fica na entrada do prédio, testemunha do entra e sai de viciados em livros, em estudos, em pesquisas, em mundos além da imaginação.

Dessa experiência criei o outro blog Pajelança das Letras onde publiquei toda a minha produção realizada a partir das atividades da oficina.

Depois, publiquei aqui igualmente, porque bem ou mal este espaço tem muito mais visibilidade do que o Pajelança.

Em 2018 fui convidada pela escritora Cleonice Alves Lopes-Flois a participar da Segunda Coletânea de Prosa do Mulherio das Letras. E aí eu participei com o conto "A Bibliotecária Sonâmbula", escrito na oficina da Casa Mário de Andrade.


E agora, ontem, 19 de outubro de 2019, participei do lançamento da coletânea Realidades Voláteis & Vertigens Radicais, gênero ficção científica, novamente sob a coordenação de Luiz Bras, um defensor figadal da produção brazuca desse estilo pouco incentivado aqui em terras brasilis.


Foi também resultado de uma oficina organizada por ele, a Escrevendo o Futuro,  da qual participei entre maio e agosto de 2018, que me fez sair de minha zona de conforto, estudar, pesquisar, ver filmes... e na verdade eu descobri que já gostava desde criança de ficção científica, pois era fã de Perdidos no Espaço, Star Treck e a literatura de Júlio Verne que mistura premonição do futuro (a FC na verdade é um pouco premonitória) com literatura fantástica, enfim, quando mostrava minha produção para o grupo descobri que estava em casa!


Parecia que sempre havia escrito aquele gênero, modestamente falando, por favor, porque tenho muita consciência de minhas limitações, limitações impostas principalmente por minha imensa capacidade de me autossabotar, indisciplina etc (sim, travo brigas imensuráveis todos os dias comigo mesma, aliás, se mais alguém aqui sofre desse mal recomendo que leia urgentemente o livro de Stefen Pressfield A Guerra da Arte, vou deixar o link do PDF pra quem se interessar).

Resumindo, todo esse blábláblá é para anunciar que Repertório Feminino está de volta. Ah! pra quem tem dúvidas, todos os meus contos sempre abordaram temas sobre a feminilidade, então não é à toa que meu blogue tem esse nome
que, diga-se de passagem, surgiu dentro de uma das minhas sessões de análise pessoal.

Vou publicar aqui os contos da fase FC (que são poucos) e está nos meus planos dar continuidade, ou dar mais vida, à minha personagem Oyaak, do conto de Realidades Voláteis e Vertigens Radicais.

Por quê?

Porque as estatísticas do Blogger me informaram que apesar da não produção desde 2017 (!) meu Repertório sempre tem leitores, alguns localizados a distâncias consideráveis no planeta, quiçá em outras galáxias!!!

Até!!

https://lookaside.fbsbx.com/file/A_Guerra_da_Arte_Steven_Pressfield.pdf?token=AWw1GKQMtOiqr7IwXlZ8b9gJn9I1n05dEi_94UPxqpNQrrDW0D3tb-GhsZ8ehB6kljvrGiDmJ1fElmebqJgSAteUcMTr18REI_vqrBh7ZPlgm4_UUS1I829yHFtH6hVsFllEJgJKt2mMjFal8mRMQDscdvwz2XhvM-sIBC6PFOStHA

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Sobre EDUCAÇÃO ALIMENTAR Por que não consigo atingir meus objetivos?

Se você está em tratamento nutricional e não está conseguindo obter o resultado desejado este texto é para você. 
Você já deve ter lido, ou ouvido falar, ou mesmo assistido a dezenas de vídeos de coachs e gurus mundo afora sobre processos de autossabotagem e modos milagrosos de se “curar”.
Se você já fez tudo o que lhe indicaram e mesmo assim não atingiu suas metas de emagrecimento,  já deve ter se perguntado por que não consegue sair desse processo.
Comportamentos de autoboicote são comandados pelo seu inconsciente, ou seja, você não tem nenhum controle sobre eles... pelo menos até que se tornem claros pra você!
Por isso não basta boa vontade nem repetir autoafirmações "milagrosas".
Não existe um truque, uma dica sensacional que apenas aquele coach tem (e que vai cobrar bem caro para lhe dar).
Existe um processo de análise que, contrariando algumas crenças errôneas, nos faz de verdade ganhar tempo para viver nossa vida mais intensamente.
Comer de forma exagerada – principalmente alimentos ou bebidas que nos dão um prazer a mais, como chocolate, doces e bebidas alcoólicas – pode ser uma forma de compensar outros tipos de prazeres que pensamos não termos direito. Comer está diretamente associado ao prazer. Se eu acredito (inconscientemente) que não tenho direito a outro tipo de prazer (como o sexual, por exemplo) posso estar compensando comendo de forma exagerada!
Se neste momento você não está conseguindo ser disciplinado o suficiente para conseguir os resultados de sua educação alimentar e utiliza “desculpas” do tipo “é só um pedacinho/golinho, eu mereço, hoje é sexta, depois eu compenso...” atenção: Pode ser que você esteja vivendo um momento de autossabotagem!
Para a psicanálise o corpo é a expressão do psiquismo, ou seja, aquilo que sentimos, pensamos e, não elaboramos bem, vai acabar aparecendo no corpo de um jeito ou de outro.
Por isso o excesso de peso pode sim ter causas de ordem emocional, que às vezes só a educação alimentar não consegue resolver e que você sozinho, por mais que se esforce, não consegue também.
Existem muitas razões para alguém comer em excesso que podem ter sua raiz no seu inconsciente. 
E por que a psicanálise pode te ajudar? 
Porque todos temos um desejo, um querer, contra o qual lutamos ou do qual nos distanciamos quando os sintomas nos incomodam. E uma análise permite reconhecer quais são os sintomas e atenuar o sofrimento para que se possa liberar aquilo que desejamos de fato. E o que é esse querer, esse desejo, senão a nossa própria vida em todos os níveis? Você pode se perguntar por que deixou sua saúde de lado...por que não SE CUIDA....
Como cheguei até aqui?
Como tenho levado a minha vida? O que me incomoda?
E não são as respostas que te farão desejar saber mais sobre você mesmo e como sair desse círculo vicioso de autossabotagem.
São os questionamentos, as dúvidas!
Este texto sobre educação alimentar é só uma isca! 
A psicanálise ajuda em todos os setores da nossa vida: relações amorosas, relações parentais, pessoais, profissionais...
E se você deseja saber mais... está na hora de começar sua análise pessoal!
:)
(texto originalmente publicado em https://www.facebook.com/lourdesriverapsi/)

SOBRE O CIÚME

Freud afirma que "o ciúme é um daqueles estados emocionais, como o luto, que podem ser descritos como normais." 
E alerta:" Se alguém parece não possuí-lo, justifica-se a inferência de que ele (o ciúme) experimentou severa repressão e, consequentemente, desempenha um papel ainda maior em sua vida mental inconsciente".
Ou seja, aquelas pessoas que costumam dizer que não são ciumentas...sinto muito informá-las, mas sim, vcs são ciumentas.. 
Freud divide o ciúme em três categorias - ou camadas ou graus, para manter os termos originais.
O primeiro nível seria esse que ele chama de "normal", mas que, "não é, em absoluto, completamente racional". Ou seja, por estar enraizado no inconsciente (sempre) e ser uma continuação das primeiras manifestações de ciúmes que temos em relação aos nossos pais, principalmente em relação à mamãe, pode levar às famosas e intermináveis DRs em que o enciumado cobra do seu objeto de amor, geralmente, mais atenção, etc, exatamente como fazia com sua mãe por ela dar (na sua opinião) mais atenção ao irmão mais velho, ou mais novo, ou ao pai, hoje em dia, ao trabalho.
Parece simples, mas não é. Tomado pelo ciúme, ainda que nesse primeiro nível, o sujeito pode imaginar situações envolvendo seu (sua) amado (a) que não correspondem exatamente à verdade. Às vezes, ele (ela) acerta em suas desconfianças. E então... há uma quebra da confiança, e o amor é posto à prova. 

Numa primeira vez é possível superar a crise. Mas quando a quebra de confiança se repete indefinidamente e as promessas de mais atenção não se cumprem, dificilmente o amor resistirá.
E aquelas pessoas que dizem que não têm ciúmes?
Nesse caso, Freud vai dizer que se trata do ciúme da segunda camada, o ciúme projetado, ou seja, essas pessoas já partem de sua própria infidelidade (realizada ou imaginada) e, portanto, acreditam que se elas traem, todo mundo trai, portanto, pra quê perder tempo com ciúme? O que elas não sabem é que elas têm tanto ciúme reprimido (lá atrás, pela mamãe, mesma coisa) que encontram alívio às pressões das convenções sociais projetando no(a) parceiro(a) a sua incapacidade de se manter fiel (minha mãe não foi fiel a mim, por que serei a ela??). Se o seu objeto de amor o trair, tanto melhor. Além de comprovar sua teoria, alivia sua própria culpa.
E a terceira camada fica com os absolutamente paranoicos, delirantes que chegam às vias de fato e cometem verdadeiras insanidades em função de seus delírios, parcela mínima da sociedade. Raros estão em análise. Geralmente quem procura ajuda são as vítimas dos seus delírios.
A maioria das pessoas talvez se encaixe no grau um e uma faixa representativa no dois. Não existem estatísticas. Mas o que se vê na clínica é:
- Se uma pessoa da camada 1 se relaciona com um indivíduo do grau 2 teremos conflitos eternos. Até porque a pessoa da camada 1 vai viver reclamando ao companheiro a falta de ciúmes dele - o que pra ela significa falta de amor - sem falar nas checadas de mensagens de celular e outras atitudes de controle que toda pessoa da camada 1 exerce. E o companheiro vai passar a vida acreditando que tudo aquilo é cena e que no fundo seu parceiro o trai, traiu ou trairá, porque afinal, para o tipo 2 ninguém é fiel, a começar dele.
- Se a pessoa da camada 1 se relacionar com outra da camada 1 poderá experimentar do próprio veneno quando o parceiro também fizer sua cena de ciúme. Talvez seja o melhor remédio e a possibilidade de o casal se equilibrar na confiança mútua é grande.
- Quanto ao sujeito da camada 2, ele já se relaciona - simultaneamente - com outros da camada 2 na categoria de amantes - porque todo amante é aquele que projeta a infidelidade no outro e, portanto, trai. E deve ter mais de um, claro! É um tipo bem mais resistente à análise.
O assunto Ciúme não se esgota aqui. É mais complexo. Mas por ora, ficamos assim.
A base para este texto foi o de Freud, "Alguns mecanismos neuróticos no ciúme, na paranoia e no homossexualismo", que vc encontra em Obras Completas - Vol XVIII.

(texto publicado originalmente na minha página do Facebook 
https://www.facebook.com/lourdesriverapsi)

LUTO

Hoje faz um mês que meu irmão, Zezé, morreu. 

Não temos muitas fotos juntos. Uma ou outra quando eu era bebê, ele me carregando no colo. Depois, acho que no casamento dele (eu fui madrinha do primeiro) e no meu (ele foi padrinho do primeiro) e alguns Natais e encontros familiares. 


Esta foto aí foi tirada em 2003/4 não tenho certeza. 
Foi em Foz do Iguaçú numa casa linda onde ele morou com a segunda família. 


Nunca fomos muito próximos, sabe? desses irmãos superunidos? não. Não era o nosso caso.
Mas nos ajudamos sempre que foi possível. Teve um tempo que precisei morar na casa dele com toda minha família e ele me acolheu. Teve um tempo que ele veio pra minha.
Ele saiu de casa muito jovem. Com 16 ou 17 anos foi pra Guaratinguetá servir na Aeronáutica. Depois foi morar no RGS por muitos anos. Nos víamos nas férias. Nos anos 80 ele veio pra SP. Eu fui pra Boituva em 87 e acho que até 96 foi o período que estivemos mais unidos. Praticamente todos os finais de semana ele ia pra minha casa em Boituva. Fim de ano revezávamos: um ano lá, outro cá.
Na última década estivemos bem distantes. Não só geograficamente (ele estava em Mongaguá). Mas era uma coisa assim: não houve uma briga, uma discussão...nada. 

Apenas um distanciamento silencioso. Sem mágoas (pelo menos de minha parte). Nos falávamos por telefone e mais recentemente pelos aplicativos de praxe. Ele sempre muito reservado. Pelo menos comigo. Era a impressão que eu tinha. Diferente daquele Zezé que animava as festas em casa.
Em maio ele me deu uma notícia chata: era sobre a sua doença. Nos vimos algumas vezes nesses últimos seis meses - não tantas quantas eu gostaria -.
Mas a última vez (que eu ainda não queria aceitar que seria a última, embora lá no fundo da alma soubesse) foi decisiva. Houve um olhar. Houve um aperto de mão longo, carinhoso, forte.. ficamos minutos assim, de mãos dadas, mas era um aperto de mão diferente. Um significante de "eu te amo" que acho que eu só disse uma vez, numa carta, quando ele estava havia poucos meses no RGS quando eu tinha uns 15 anos.
Parece que preciso da distância pra avaliar com clareza os sentimentos. A sensação, hoje, é a de que ele simplesmente está distante, meio que como sempre esteve de um jeito ou de outro, mas que a qualquer momento vamos nos ver, ou nos falar.
É isso. Não tive vontade de expor publicamente um mês atrás. Mas agora é possível.
Precisei de um certo distanciamento. De novo.


(texto publicado originalmente no Facebook em 06/12/2017)

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Esquartejando palavras

não precisa entender tanto faz a ordem quando olho pra esses jardins ensimesmados minha vontade é despedaçar palavras cortar em várias partes esquartejar e fazer você engolir fração por fração até ser um inteiro completo desse amor fragmentado que eu teimo em cultivar todos os dias desde sempre desde quando nem havia a luz nem o verbo e se fez a dor que só os poetas entendem e você teima em dizer não existe é coisa do imaginário mas a minha é palpável é sanguinolenta malcheirosa putrefata e está à deriva à tona descoberta e você ignora ou finge e nessa hora salto no abismo desse desejo hermético obscuro inerte como as estrelas já mortas do universo vomitando os excrementos da saudade do seu toque nessa distância de anos luz que faz do nosso amor o mais antigo que invadiu meu coração quando me apaixonei pelas palavras não ditas pelas entrelinhas pelos escaninhos do tempo meu querido meu amigo desde sempre desde antes da criação do cosmos vou te amar aqui e morar em seu coração albergue que abriga todos os desvalidos inclusive eu entrei assim como um sem chão e você me deu de beber dos seus beijos me deu de comer do seu corpo  fui ficando e agora tenho direitos adquiridos por usucapião a sua ração diária de carinhos no café da manhã almoço e jantar petiscos de sexo nos intervalos meu amor talvez o que você nem saiba é que agora seu sangue circula no meu sistema na velocidade acelerada das manhãs apocalípticas do meu entardecer e antes que o sol se ponha definitivamente anote mais uma vez o que fica eu te amo mas não precisa entender tanto faz a ordem quando olho pra esses jardins ensimesmados minha vontade é despedaçar palavras cortar em várias partes esquartejar e fazer você engolir fração por fração até ser um inteiro completo desse amor fragmentado coisa do imaginário desde sempre desde quando nem havia a luz nem o verbo desde antes da criação do cosmos você teima em dizer não existe pelas entrelinhas pelos escaninhos do tempo você me deu de beber dos seus beijos me deu de comer do seu corpo  fui ficando e agora tenho direitos adquiridos por usucapião a jantar petiscos de sexo nos intervalos desse desejo hermético obscuro inerte como as estrelas já mortas vomitando os excrementos da saudade do seu toque vou te amar aqui e para sempre morar em seu coração albergue que abriga todos os desvalidos inclusive eu entrei assim como um sem chão mas não precisa entender tanto faz a ordem quando olho pra esses jardins ensimesmados minha vontade é te amar aqui e para sempre morar em seu coração albergue coisa do imaginário do meu entardecer quando nem havia a luz nem o verbo salto no abismo à deriva vomitando sanguinolenta malcheirosa putrefata quando olho pra esses jardins ensimesmados minha vontade é despedaçar palavras anote mais uma vez o que fica eu te amo

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

ODE AOS CRENTES

Acreditei em cegonha, coelhinho da Páscoa e Papai Noel
Acreditei que o homem andou na lua
Acreditei que leite com manga fazia mal
Acreditei.
Acreditei que o bem sempre vencia o mal
Acreditei que bastava me confessar para um padre que os pecados estariam perdoados
Acreditei em pecados
Acreditei em perdão
Acreditei.
Acreditei em finais felizes e fins de semana coloridos
Em almoços de família em domingos ensolarados
Acreditei em versos e prosas
Em discursos e movimentos
Em ideais e mantras
Acreditei.
Acreditei em afirmações positivas
Em meditação ativa
Tarô, mitos e astrologia
Acreditei que amor rima com dor
Rima empobrecida e desgastada pela rotina
Acreditei em vida eterna, vida longa, sem limites
Acreditei
E finalmente, acreditei nas pessoas, nas promessas, nas palavras
Sem saber que é preciso aprender a não acreditar em nada
Que não seja em sua própria falta de razão para existir.

Apenas ser.

domingo, 13 de agosto de 2017

Meu pai já era um metrossexual nos anos 50


Não sei se na década de 50 todos os homens eram vaidosos como meu pai. Vendo as fotos de sua juventude, e juntando com as minhas lembranças, acho que ele já era um metrossexual naquela época. Usava terno todos os dias, sempre cheiroso com sua Água de Lavanda Alfazema, tinha o cuidado de sempre ter um lenço de cambraia em um dos bolsos do paletó com o mesmo cheirinho da lavanda (quem viu o filme "O Estagiário", com o Robert de Niro, sabe do que estou falando!). Vestia-se com elegância em todas as ocasiões. Mesmo para ficar em casa, lá estava ele de calça e camisa social (de manga curta), sapatos e meias. Chinelos só para ir do quarto para o banheiro na hora do banho, ou na praia!
Cuidava da nossa saúde, sempre atento a espirros e tosses, febres e diarreias. Nos medicava com fitoterápicos. Era adepto à homeopatia. Queria ter sido médico - sua maior frustração -. Não deu. Com pouco mais de 14 anos teve de sustentar a mãe e mais 9 irmãos menores com a morte prematura do pai - um jornalista boêmio que não se ligava muito em contas e outras obrigações. Herança do avô e do bisavô. Todos jornalistas e boêmios (como a maioria de seus irmãos).
Assim, contam as histórias. Meu pai não foi jornalista, mas adorava ler jornais, lia uns três por dia e eu cresci ali no meio daqueles jornais todos, e discos (ele adorava ouvir música sozinho na sala, na penumbra, e eu já me vi fazendo assim tantas e tantas vezes na minha vida), e livros, prateleiras e prateleiras deles, de todos os gêneros. Meu pai achava que a gente tinha de saber um pouco de tudo, além do que a escola ensinava. Meu interesse pelas civilizações antigas, papiros e pergaminhos vem daqueles livros enormes sobre egípcios, tumbas e faraós, e também um pouco porque ele era da Rosa Cruz - e às vezes eu lia escondida o material da Ordem que ele guardava a sete chaves num baú de madeira.
E a escrivaninha dele? Era meu xodó. Mas deu cupim, não conseguimos salvar.
Ele lutou na Revolução de 1932 - foi "pracinha". Tinha um parabelo e um capacete verde do exército como lembrança. Sentia orgulho de São Paulo ter-se rebelado contra o governo golpista de Getúlio Vargas. Era contra a ditadura mas não era a favor dos comunistas. Contra todo tipo de tortura e violência, como não tinha papas na língua, quando saía para trabalhar ficávamos com medo de ele ser preso porque ele não escondia de ninguém que abominava o governo militar, embora não fosse comunista! Ele sempre deixou clara sua admiração e respeito pelo povo russo, mas achava que ser contra o governo militar não fazia dele um comunista.
Tenho boas lembranças de papai nos almoços de domingo, quando a família invariavelmente se reunia, e em festas nas casas de parentes. E em viagens. Papai gostava de viajar. Nunca teve carro, mas isso não era problema. Tinha um amigo taxista que nos levava até a rodoviária em São Paulo (onde hoje é a cracolândia) e de lá pegávamos o ônibus para Itamonte, em Minas, na bela Serra da Mantiqueira - ponto de partida para passeios no circuito das águas: Caxambu, São Lourenço, Baependi. Outro roteiro de férias era Guaratinguetá, no Vale do Ribeira, onde ele havia passado parte da adolescência e juventude e onde ainda moravam bisavó e tias que fizeram parte de momentos importantes de minha infância. Talvez seu maior defeito fosse beber além da conta quase todos os dias. Mas não ficava agressivo. Chorava se estivesse triste, lamentando sua adolescência interrompida - , ou se estivesse alegre, cantava junto com os discos que ouvia. Arriscava dançar nos melhores dias.
Era um homem que queria ser alegre e deve ter sido. Talvez antes dos filhos chegarem e as responsabilidades aumentarem _ responsabilidade era uma palavra com um peso imenso que ele carregava nas costas desde os 14 anos. Essas fotos que ilustram este texto são de 1950, quando ele ainda estava em lua de mel... Parecia bem feliz!
Meu pai achava que o casamento devia ser a última opção de vida. "Primeiro faça e viva tudo que tem vontade. Conheça lugares, pessoas, tenha experiências..." - era seu mantra. Ele se casou depois de todas irmãs e irmãos se casarem e depois dele ter namorado todas que teve vontade até que conheceu minha mãe. Ele não achava que eu tinha de me casar. Antes, estude, trabalhe... Infelizmente eu não o ouvi - como em geral fazem todos os filhos. Fiz tudo junto e misturado.
Pena que ele morreu cedo. Ele fez (faz) muita falta. Eu mal havia me casado (a primeira vez). Então, meus filhos não tiveram a oportunidade de conviver com esse homem possível, cheio de qualidades e de defeitos, que tinha dias bons e outros nem tanto. Não era santo nem demônio. Era apenas o pai que me coube nesta vida.

Deixando o Rancor de Lado: Cultivando a Liberdade Interior

O   rancor é um sentimento negativo que pode prejudicar nossa saúde mental e nossos relacionamentos. Abaixo, apresento algumas estratégias ...