quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Quando não existe amor

Mais historinhas da minha amiga Valkiria, com K, ela me disse, faz questão. Então, tá. Val tem um jeito de menina. Às vezes, de moleca. Parece que não cresceu. Por alguma razão que ainda não se sabe, necessita de carinho, amor e aprovação. Mas não teve todo o amor, carinho e atenção que merecia, ou que necessitava. A vida toda. Então, pensando que seria amada, minha amiga Val fazia tudo para agradar aos outros. Mas não fazia nenhum agrado a si mesma. Casou pra agradar aos pais, descasou pra salvar a filha (as duas vezes), comprou um carro que não queria, uma casa num lugar quer não queria, usou um vestido de 15 anos que odiou num modelo que odiou numa cor que odiava, para agradar a mãe, a tia...aliás, abriu mão do seu quarto de adolescente - onde dispunha de privacidade para seus devaneios de menina-moça, onde ficava até madrugada escrevendo em sua escrivaninha querida, com a TV portátil que ganhara no padrinho querido no Natal, ouvindo suas músicas prediletas na vitrola também portátil ou no com seu radinho de pilha fashion - para dividir um outro quarto, longe de seu banheiro privativo, pra fazer companhia pra tia chata que não a deixava dormir pq ouvia um maldito radinho de pilha numa emissora chata que tinha um apito maldito a cada hora.
Valkiria odiou ter de se separar do "seu mundo e nada mais" como dizia a letra do sucesso de Guilherme Arantes dos anos 70, mas Val nunca disse não. Odiava, mas acaba fazendo sempre o que os outros queriam.
Poucas vezes, ela me disse, fez o que tinha vontade. Quando Valkiria se rebelava era tida como boca dura, malcriada, malagradecida. Então, como sua necessidade de ser amada e como seu autodesamor eram muito grandes, Val era servida em sacrifício para os lobos. Val era a oferenda. Alguém tinha de se sacrificar, Val, você é muito egoísta, você só pensa em você Val, você só pensa no seu conforto, menina mimada!
E assim, Valkiria foi guardando segredos. Quem vai acreditar em mim? pensava a menininha escondida atrás da porta. A madre da escola do ensino infantil que não acreditou que ela tinha feito o desenho e a colocou de castigo no canto da classe porque ela era a "filha da diretora" e, portanto, precisava servir de exemplo para os outros alunos. A madre não acreditou, a mãe não confirmou. E por inúmeras ocasiões, Val teve sua palavra questionada, Val teve sua verdade questionada. Por quantas e quantas vezes Val foi tida e havida como mentirosa dizendo a verdade? Então, já que era assim, Val também passou a mentir, fantasiar, inventar...que diferença faz? Ninguém acredita mesmo!
Se tivesse sido bem orientada, poderia ter se tornado uma ótima escritora. Quem sabe, uma segunda Clarice Lispector, uma Zelia Gattai? Uma autora de novelas famosas? Uma Janete Clair? Quem sabe? Imaginação não lhe faltava. O que faltava a Valkiria era amor. Amor por si mesma.

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